• “Europa só tem a ganhar se tiver parceria e cooperação com uma África desenvolvida”


    Os continentes africano e europeu têm muito mais a ganhar do que a perder se caminharem sempre juntos, num quadro de respeito mútuo, afirmou, segunda-feira, em Luanda, o Presidente em exercício da União Africana (UA), João Lourenço.

    Ao proferir o discurso de abertura da 7ª Cimeira União Africana – União Europeia, que termina hoje, na capital do país, o estadista angolano sublinhou que os dois continentes têm tudo para beneficiar e desenvolver os seus territórios, desde que partilhem e cooperem em benefício mútuo.

    “A Europa tem o know-how e a tecnologia, África tem as matérias-primas fundamentais para as indústrias do mundo, tem as terras aráveis que não estão ainda saturadas, contaminadas com excesso de fertilizantes e agrotóxicos, tem cursos de água abundantes para irrigação e para a produção de energia limpa, tem sol em abundância para a produção de energia igualmente limpa e tem abundante mão-de-obra jovem, que, com formação adequada, pode mudar o quadro vigente”, declarou o Chefe de Estado angolano.

    O Presidente em exercício da UA enfatizou que a Europa só tem a ganhar se tiver parceria e cooperação com uma África desenvolvida, que não remeta emigrantes ilegais para os países europeus através do Mar Mediterrâneo e que não tenha necessidade constante de pedir doações e o perdão da dívida.

    Para João Lourenço, a relação entre a União Africana e a União Europeia deve ser guiada por um espírito de pragmatismo, isento de teias burocráticas, que muitas vezes retardam o bom andamento e a implementação de importantes acções projectadas conjuntamente.

    O líder em funções da União Africana ressaltou que África não se pode manter na situação de pobreza que dominou o panorama no continente durante décadas, porque isso representa um problema não só para os africanos, mas, também, para o resto do mundo, que se vai confrontando com situações cada vez mais difíceis, que resultam do estado de carência dos povos africanos, nomeadamente do surgimento, com alguma frequência, de epidemias diversas, emigração massiva, conflitos internos e outros males que assolam o continente.

    João Lourenço disse ser com o objectivo de superar esse estado de coisas que atribui uma grande relevância à cooperação União Africana - União Europeia, tendo apelado, por isso, à necessidade de se reforçarem os meios e os recursos a serem disponibilizados para a dinamização crescente da cooperação económica desenvolvida pelos dois continentes, para que empresários e investidores europeus se interessem por África e invistam na industrialização do continente e em sectores da economia africana que impulsionem o crescimento e produzam benefícios recíprocos.

    O estadista angolano reiterou a existência, em África, de alguns projectos estruturantes, designadamente os que estão relacionados com a aceleração da conectividade digital, com a transição energética e com o Corredor do Lobito, infra-estrutura que disse representar grandes ganhos na ligação entre o continente africano e o resto do mundo.

    Esta infra-estrutura ferroviária, avançou o Presidente João Lourenço, vai alavancar a produção agrícola e industrial, viabilizar a integração económica regional e continental, promover o comércio no âmbito da Zona de Livre Comércio Continental Africana e, também, assegurar a canalização de minerais críticos e de importantes commodities.

    Bons exemplos de cooperação entre os dois blocos continentais
    Apesar das metas ainda por alcançar nas relações entre os dois continentes, o estadista angolano disse haver muito bons exemplos de cooperação entre a União Europeia e África, que se ilustram, de uma maneira geral, pelas iniciativas que englobam o Global Gateway e, no plano bilateral, particularizando a relação Angola-União Europeia, a parceria que se desenvolve no âmbito do “Caminho Conjunto”, que disse estar a processar-se de forma satisfatória, recomendando-se, por isso, que se mantenha e se consolide.

    Nesta conformidade, João Lourenço estimou o modo como funciona a cooperação entre os dois blocos continentais, mas disse ser útil que, em alguns aspectos, sobretudo os que dizem respeito às medidas que devem procurar tomar para garantir a fixação dos jovens africanos nos seus países de origem, se realizem projectos que assegurem a empregabilidade desse segmento da população.

    A materialização desse desiderato, na opinião do estadista angolano, deve começar pela garantia da formação profissional, para darem resposta à carência de quadros em África, a fim de se habilitarem a integrar as equipas ligadas à execução dos projectos conjuntos que são desenvolvidos e a responderem às necessidades em termos de mão-de-obra de empresas europeias e outras que investem no continente africano.

    No que diz respeito ao empreendedorismo, investimento e todas as iniciativas que possam fazer mover as economias dos dois continentes, João Lourenço considerou pertinente o facto de que África tem uma necessidade vital de poder ter acesso ao financiamento com custos comportáveis, para aplicá-lo na execução de obras de alcance estratégico destinadas a garantir a electrificação do continente, a industrialização, a mobilidade de pessoas, bens e serviços e conseguir-se, assim, edificar as bases que vão impulsionar o desenvolvimento do continente.

    No capítulo económico, o Presidente em funções da União Africana aplaudiu o posicionamento assumido pelos parceiros europeus durante a 4ª Conferência Internacional sobre o Financiamento para o Desenvolvimento, realizada em Sevilha, Reino de Espanha, de 30 de Junho a 3 de Julho do corrente ano.

    João Lourenço disse que os parceiros europeus se mostraram, nesta ocasião, sensíveis ao apelo que fez ontem, em nome de toda a África, sobre a urgência de se trabalhar no sentido de se conseguir uma reforma abrangente do sistema financeiro global, que inclua mecanismos mais justos de reestruturação da dívida, a expansão das alocações de direitos especiais de saque e instrumentos inovadores de financiamento que apoiem o esforço de desenvolvimento africano.

    “Temos grande necessidade de uma nova visão sobre a relação no plano financeiro entre África e as instituições creditícias internacionais, para que possamos investir no desenvolvimento, evitando a asfixia provocada pelo endividamento insustentável”, ressaltou.

    O Presidente em exercício da União Africana considerou a 7ª Cimeira União Africana - União Europeia uma oportunidade ímpar para se fazer uma reflexão profunda sobre a trajectória das relações entre os dois blocos e proceder às correcções que se afigurem necessárias.

    João Lourenço salientou que no transcorrer dos 25 anos de parceria entre as duas organizações continentais, o conhecimento mútuo aprofundou-se, a cooperação bilateral solidificou-se e a parceria que mantêm ampliou-se para todos os campos e sectores de interesse mútuo, com resultados que animam as partes a seguir em frente, dado o facto de "os bons resultados" estarem à vista e o futuro afigurar-se cada vez mais promissor. "Temos vindo a construir canais de diálogo e de cooperação em várias áreas, tais como as da paz e segurança, comércio e investimento, governação, educação, saúde, acção climática e transformação digital", afirmou.

    João Lourenço destacou que a 7ª Cimeira União Africana-União Europeia constitui um acontecimento que se destina a ser, ao mesmo tempo, um guia das relações, uma bússola no caminho conjunto e uma ponte que une os dois continentes, que têm profundos laços históricos de cooperação.

    Definição de eixos claros de prioridades

    Enquanto Presidente da União Africana, João Lourenço disse que o país definiu eixos claros de prioridades que reflectem tanto as aspirações continentais como o compromisso com a transformação de África.

    Neste âmbito, o Chefe de Estado disse que era necessário dar-se um passo essencial, no sentido da consolidação da paz, da estabilidade e da segurança em África, por se tratar de factores sem os quais haveria maiores dificuldades de promover a aceleração da integração económica, o empoderamento da juventude e das mulheres, assim como garantir progressos em matéria de resiliência climática e de transição energética.

    “Nada disso é realizável sem que a voz de África seja efectivamente escutada ao nível da governação global, em que deveremos acentuar o nosso papel no que se refere às reformas estruturais capazes de tornar as instituições internacionais mais inclusivas e representativas, para que seja arquitectado um sistema internacional em que todos participem nas decisões em igualdade de circunstâncias”, declarou.

    João Lourenço disse haver consciência dos esforços que devem ser envidados para se aprimorar, de uma maneira geral, os modelos de cooperação essenciais, para que se consiga tirar os maiores benefícios possíveis da parceria entre África e Europa, que disse revelar-se dinâmica e muito orientada no sentido de contribuir para a resolução dos principais problemas e desafios que os dois continentes enfrentam no processo do desenvolvimento económico e social dos seus países.